Estado 4.0
Uma evolução do Estado até a concepção de estado 4.0.
Bruno Pereira Ferreira
11/7/20253 min read
“O Estado sempre foi o espelho do seu tempo: do rei absoluto à república democrática.
Agora, na era digital, nasce um novo tipo de governo — inteligente, conectado e invisível.
Mas até que ponto o Estado moderno ainda pertence ao povo?”
O Surgimento do Estado
O Estado sempre refletiu o seu tempo histórico e a forma como as sociedades se organizaram. Como observa Norbert Elias, “o Estado é um processo em constante formação, resultado da teia de relações humanas que se complexifica ao longo dos séculos”. Desde a Antiguidade, civilizações e impérios foram governados por leis escritas, estruturas rígidas e práticas de coerção. A guerra, o comércio e a religião eram pilares fundamentais da ordem política.
Na Mesopotâmia, o Código de Hamurabi expressou uma das primeiras tentativas de sistematização jurídica, enquanto no Egito Antigo os hieróglifos registravam a autoridade divina dos faraós. Ao longo do tempo, as sociedades passaram da escravidão para formas servís e, posteriormente, para o trabalho assalariado, em um processo analisado por Eric Hobsbawm como parte da “longa transformação do mundo pré-industrial”.
Com as Revoluções Burguesas e a derrocada do absolutismo, especialmente a partir da Revolução Francesa de 1789, surgiram novas formas de organização política baseadas na divisão de poderes, conforme defendido por Montesquieu. A centralidade do Estado deixou de estar concentrada na figura do monarca e passou a constituir-se em instituições republicanas. Nas Américas, inspirada pelos ideais iluministas, formou-se a primeira república moderna do continente, inaugurando um novo paradigma político.
O Estado Moderno
Após guerras, revoluções e profundas transformações sociais, consolidou-se o Estado moderno, marcado pela burocracia racional-legal descrita por Max Weber. Repúblicas se espalharam pelas Américas e pela Europa, e a participação popular tornou-se mais frequente, ainda que desigual.
Após a Segunda Guerra Mundial (1945), o mundo assistiu ao confronto entre capitalismo e socialismo, fenômeno intensamente estudado por Hobsbawm em sua obra sobre o “breve século XX”. No Norte da Europa, emergiu a social-democracia, modelo que posiciona o Estado como mediador entre sociedade e mercado, conforme analisa Norberto Bobbio.
No Ocidente, o Estado moderno passou a operar com exércitos profissionais, normas, leis e filosofias políticas fortemente influenciadas por tradições cristãs. No Oriente, sistemas filosóficos como o budismo buscaram o equilíbrio entre autoridade e espiritualidade. As independências das ex-colônias britânicas e a fragmentação dos impérios coloniais redefiniram a ordem global, que passou a ser estruturada por instituições internacionais e pelo avanço tecnológico.
O desenvolvimento aeroespacial, a popularização dos eletrônicos, a massificação da televisão e o surgimento da internet transformaram a esfera pública. As democracias se expandiram pelo continente americano, e os direitos individuais tornaram-se elementos centrais da vida política contemporânea. Contudo, surgiram novos extremos ideológicos: uma direita que defende o Estado mínimo e uma esquerda marcada por pautas identitárias. Como observa Foucault, o poder moderno tende a se fragmentar e se reinventar, muitas vezes se afastando da voz popular e alimentando discursos de antagonismo.
O Estado Digital
O Estado Digital, ou Estado 4.0, emerge do avanço de softwares, aplicativos, automação e plataformas de prestação de serviços públicos. Ele introduz uma nova forma de democracia operacional, baseada no acesso digital, no agendamento on-line e na integração entre órgãos governamentais e cidadãos.
Entretanto, como destaca Manuel Castells, a sociedade em rede produz tanto inclusão quanto novos tipos de exclusão. Persistem desafios sociais e comportamentais: saber utilizar ferramentas digitais, interagir de forma adequada no ambiente on-line e desenvolver competências informacionais. A convivência virtual é marcada por conflitos, discursos de ódio e circulação massiva de desinformação.
Dados tornaram-se ativos estratégicos e altamente monetizados, movimentando bilhões de dólares. A exposição da imagem das pessoas cresce de forma exponencial, enquanto a credibilidade da informação é constantemente questionada devido aos interesses divergentes que permeiam o ambiente digital. O Estado Digital é moderno, participativo, veloz — e também perigoso. Saber escolher, discernir e interpretar tornou-se a chave da sobrevivência cívica e republicana no século XXI, sabendo que cada vez mais é controlado e pressionado tanto pelo povo quanto por empresas de diversos segmentos.
Bibliografia Sugerida
Norbert Elias – O Processo Civilizador: análise do desenvolvimento das estruturas sociais e do comportamento político.
Max Weber – Economia e Sociedade: fundamentos do Estado moderno e da burocracia racional-legal.
Eric Hobsbawm – A Era das Revoluções, A Era dos Impérios, A Era dos Extremos: interpretação clássica da formação do mundo contemporâneo.
Michel Foucault – Vigiar e Punir; Microfísica do Poder: compreensão da lógica do poder na modernidade.
Norberto Bobbio – Estado, Governo e Sociedade: definição do papel do Estado democrático e do Estado social.
Benedict Anderson – Comunidades Imaginadas: formação das nações modernas.
Manuel Castells – A Sociedade em Rede: análise do impacto das tecnologias da informação no poder e no Estado.
Hannah Arendt – A Condição Humana: reflexões sobre ação política, esfera pública e modernidade.
John Locke & Montesquieu – Obras fundamentais sobre contratualismo e divisão dos poderes.
